Ó MARIA CONCEBIDA SEM PECADO, ROGAI POR NÓS QUE RECORREMOS A VÓS!

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020


NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS NO PLANO DE DEUS



Toda criatura, antes de existir no tempo, existiu na eternidade, dentro dos eternos desígnios de Deus. Para Deus não houve passado e nem haverá futuro. Existe, existiu e existirá sempre o eterno presente, pelo conhecimento atual de tudo, conhecimento esse que é, n'Ele, Deus, uma atualização eterna das causas. A história do mundo e das criaturas, é escrita e lida eternamente por Deus num presente sem principio e sem termo.
E é assim que Maria Santíssima existiu, no seio e no pensamento de Deus, eternamente.(1) E pode-se até dizer, mais que de outra criatura, Deus ocupou-se d'Ela, pois nenhuma outra mais intimamente está com Ele relacionada.
São Bernardo chega a afirmar que Maria Santíssima é a 'obra da eterna idealização de Deus' - opus oeterni concilii - e a sua 'preocupação de todos os séculos' - negotium soeculorum.(2)
'É uma coisa inconcebível diz o Venerável Olier – como Deus, desde a eternidade, antes da formação de todas as criaturas, trazia presente a seu espírito esta divina Esposa. Para Ele não há futuro nem passado; tudo é presente aos seus olhos: na luz eterna: Ele vê distintamente todas as causas. Desde toda a eternidade havia, portanto, no Pai, um caráter, uma figura, que representava Jesus Cristo e sua Mãe, e, desde então, estava Maria tão presente aos olhos e ao espírito de Deus, como se já fora formada, como se estivera já efetivamente no mundo'.
E por que e como se ocupava Deus de Nossa Senhora desde a eternidade? A resposta a estas perguntas põe-nos em face do mistério da Mediação universal de Maria no plano salvífico.

POR QUE ENTRA MARIA NO PLANO DIVINO
Por que estava Maria no pensamento eterno de Deus? Por causa do seu grande, do seu impreterível papel na obra divina.
A principal circunstância de uma realização qualquer preocupa constantemente a seu idealizador. E foi o que aconteceu com Deus em face de nossa salvação; querendo salvar-nos, e querendo salvar-nos por nós o quanto possível tornou-se circunstância principalíssima desta realização a Mulher que o coadjuvaria neste divino mistério. E foi por isto que Maria Santíssima entrou nas preocupações de Deus juntamente com os mistérios eternos do divino Filho.
Longe de nós afirmar qualquer dependência em Deus.
Maria SS. é uma circunstância principalíssima na obra redentora, mas não era absolutamente necessária à execução dos divinos mistérios. Poderia Deus, se o quisesse, providenciar de outro modo ao resgate do gênero humano.
Anunciação de Maria

A verdade, porém, é que não o quis. Tal foi o seu desígnio eterno: que o Verbo se encarnasse; e que se incarnasse em Maria Virgem; que associasse a toda a obra divina de nossa salvação uma mulher. E isto Deus o quis desde toda a eternidade, e o quis irrevogavelmente. Já então Nossa Senhora se torna uma circunstância necessária por 'necessidade de fato, vista a preordenação do plano divino. Esta necessidade não nasce de precisão alguma de Deus, mas do fato de Ele assim querer eternamente.
Logo, Maria SS., pelo querer de Deus, recebeu um papel impreterível e grandioso na obra de Deus. E Deus não pôde deixar de tê-la sempre diante dos olhos e devotar-lhe um amor de predileção. A Ela, principalmente, diz Deus: In charitate perpetua dilexi te.(3)
No plano divino aparecem, por isto, unidos, numa só visão, eternamente, o Verbo Encarnado e Maria, sua Mãe.(4) Não podem ser desunidos no pensamento do Altíssimo e, como tal, jamais deverão ser separados no amor das criaturas.

COMO ENTRA MARIA NO PLANO DIVINO
E como entra a SS. Virgem nesta idealização eterna?
Totalmente, respondemos. Isto é, Maria não entra e não pode entrar nos segredos irrevogáveis de Deus como um auxílio secundário e esporádico, que, uma vez utilizado, vai perder sua razão de ser. Sua inclusão no plano salvífico é total porque divina e irrevogável.
Maria, por assim dizer, preocupa Deus eternamente, devido à excelência e à extensão de seu papel. Trata-se de formar uma digna Mãe de Deus no tempo e trata-se de outorgar-lhe um papel tão extenso e durável quanto toda a obrá 'ad-extra' de Deus.
O Infinito não faz as suas obras pela metade e nem imperfeitamente. Logo, Maria será o que há de mais excelente em dignidade ede mais duradouro em sua função. A sua atuação na grande obra de Deus será tão duradoura quanto esta própria obra.
Não se trata, pois, somente, da predestinação inaudita à maternidade divina, o que é uma visão parcial do desígnio eterno sobre Maria. Trata-se da predestinação da Virgem a tudo o que se realizar mediante a Encarnação do Verbo.
Tem-se salientado suficientemente a idealização eterna de uma Mãe de Deus, ornada de todos os favores, privilégios e graças. Mas tem-se esquecido que Nossa Senhora não é só isso. Deus idealizou sua Mãe completa, que é também nossa Mãe na ordem da graça.
Se idealizou-a em ordem à Encarnação, idealizou-a também em ordem à Redenção, em ordem à Eucaristia, em ordem à organização da Igreja, em ordem à Mediação universal. Porventura não tem Maria SS. o seu papel em tudo isto? Portanto, a tudo isto foi predestinada 'ab oeterno'.(5)
Maria, Sede da Sabedoria

CONSEQUÊNCIAS PARA A TEOLOGIA
A predestinação de Nossa Senhora assim compreendida mostra-nos que todas as graças que Deus lhe predestinou têm um alcance mais vasto do que simplesmente prepará-la à Maternidade divina. Destinam-se a prepará-la à Mediação universal das graças.
Toda a relação eterna de Deus para com Maria, se assim posso dizer, tende, portanto, mais sinteticamente, a formar a divina Medianeira entre Deus e os homens. A formação da Medianeira universal inclui a formação da Mãe divina.
Sob este aspecto, a teologia marial recebe um novo fulgor muito mais caro ao coração do homem, para quem em última análise Maria Santíssima é idealizada nos planos de Deus. Vê-se então a Deus como 'summum bonum, diffusivum sui', cogitando de dar-se a nós por meio de Maria ao mesmo tempo que cogita receber alguma coisa de nós por meio de Maria.
A preparação de Nossa Senhora, quer pela sua Conceição Imaculada, quer pelo crescimento contínuo de suas graças em várias plenitudes, projeta-se, portanto, na totalidade da obra salvífica de Maria, ou seja, na Mediação, e não só na sua Maternidade divina. E é neste sentido que podemos falar, com exatidão teológica, de Nossa Senhora das Graças no plano eterno de Deus.
A última realidade na execução é a primeira nos planos, sentenciam os filósofos. Sobretudo em Deus, é isto verdade de longo alcance. O que por último se executa no tempo foi o que por primeiro se idealizou na eternidade.
E, na ordem do desenvolvimento dos dogmas marianos, assim como o último que se propõe às almas é a Mediação de Maria, assim foi ele o primeiro intencionado nos planos divinos.

O FATO DA MEDIAÇÃO NO EVANGELHO
No reverso da Medalha Milagrosa, os Corações
(dolorosos) de Jesus e Maria estão unido;,
a cruz está entrelaçada - como que apoiada -
sobre o M de Maria

Por isto mesmo, nada que tenha mais plena realização no Evangelho e na história da Igreja do que a Mediação de Maria. Nossa Senhora aí aparece ligada a toda a estrutura vital do cristianismo. Ela está no princípio da vida cristã – a Encarnação – e prende-se tão intimamente com Jesus Cristo, Verbo Encarnado, que é d'Ele inseparável no tempo e na eternidade.
Impossível separar Cristo de sua divina Mãe em todos os mistérios, desde a própria Trindade, cujo Verbo, anteriormente ao tempo, já se determinara a ser o Filho de Maria.
Nasceu a Vida nova, sobrenatural, para os cristãos, graças ao sangue de Cristo Redentor. E Maria foi quem lhe deu este sangue, quem formou nas puríssimas entranhas o corpo sacrossanto, Vítima futura do Calvário, de cujo lado aberto nasceu a Vida. É Maria, continuando a ser um fato no plano salvífico.
Deste mesmo Coração trespassado de Cristo nasce a Igreja, Esposa de Jesus – diz Sto. Ambrósio.(6) E Maria SS. é, não só a primeira que à Igreja se incorpora, mas também a primeira que a assiste, conforta e ensina, continuando, com os Apóstolos, a obra de Jesus. Muito mais que simples incorporada e continuadora, com os Apóstolos, da obra de Cristo, Maria – primeira resgatada e incorporada – começa logo a cooperar com Jesus na própria Redenção objetiva. É Corredentora, não no sentido vulgar em que nós também podemos ser corredentores, na aplicação dos méritos, mas lá, na aquisição deles.
Nos primórdios da Igreja nascente, Nossa Senhora já era a Senhora dos primeiros cristãos, a Mãe de todos eles, não por título de afeição, mas por ordenação divina. Mediante Maria, comunicava Deus as primeiras graças à sua Igreja.
Vão os Apóstolos para o Cenáculo. Está a sociedade divino-humana que Jesus fundou prestes a ser promulgada solenemente com a descida do Paráclito. E Maria Santíssima lá está com a Igreja, orando, e certamente instruindo. Inegável à luz da mais sã teologia que a prece da Virgem forçou poderosamente o coração do Pai e do Filho para a missão visível do Espírito Santo, como anteriormente abreviara as esperanças do Messias, apressando a Encarnação do Verbo. E é por isto que o Autor do Atos tem o particular cuidado de mencionar-lhe o nome entre os Apóstolos reunidos no Cenáculo: Omne.s erant perseverontes unanimiier in oratione um ... Maria Matre Jesu ... É o fato de Maria no plano sobrenatural prolongando-se em todos os mistérios. Encarnação, Redenção, fundação da Igreja, vinda do Espirito Santo, fração do pão ou Eucaristia – e consequentemente a vida cristã através dos séculos, a qual dimana destes mistérios – tudo está preso, inquebrantavelmente à oração de Maria, à Mediação universal de Maria.

CONCLUSÃO
Grande e sublime verdade! Deus quis, desde a eternidade, que uma simples mulher regesse, a bem dizer, toda a vida sobrenatural dos homens. Maria SS. é a impreterível Medianeira entre Cristo e nós.
A sim querido este "fato" desde o principio dos tempos, até o fim dos mesmos tempos Deus o levará à execução.
Começará por preparar Maria. A infinidade de seus dons, Deus os derramará em Maria. Totius boni plenitudinem posuit in Maria – diz São Bernardo.(7) E Ela há-de ser "cheia de graça" – gratia plena.
E tudo terminará por constituí-la Deus Dispenseira destes mesmos bens. E a não ser por Ela e d'Ela, ninguém receberá a graça de Deus. Omnia nos habere voluit per manas Mariae, completa S. Bernardo.(8)
Cheia de graça para si, Deus a quis mais cheia ainda para nós. Plena sibi, superplena nobis.
Sim, tudo o que descer do céu será embalsamado pelo fragor de suas preces e trará o hálito celeste de seus beijos de Mãe!"




_________________
(1) "Ce n'est pas seulement au moment où il allait réalizer ses promessas miséricordieuses et donner à la terra le Redempteur qu'il lui avait annoncé, que Dieu se préocupa de choisir une mere pour son Fils. De toute éternité, la creature bénie qu'il devait associer à sou oeuvre du salut avait été présente à sa pensée. L'Égllse nous l'affirme de la façon plus formelle lorsqu'elle appllque à larie, dans sa liturgia, les pa- roles qui ont été dites de la Sagesse éternelle". (Ganiguet - La Viège Marie, 7ème édit., p. 9)
(2) Sermo II De Pentecoste.
(3) Jer. 31, 31
(4) Ex Bulia (logmatica Pii Papae IX - "... Ab inltio et ante soecula unigenito Filio suo Matrem, ex qua caro factus in beata temporum plenitudine na.sceretur, elegit atque ordinavit, tantoque prae creaturis universis est prosecutus ama- re... " "Ipsissima Verba, quibus divinae Scripturae de increa- ta Saplentia loquuntur, ejusque sempiternas origines reprae- sentant, consuevit Ecclesia., tum in ecclesiasticis officiis, tum in sacrosancta liturgia aãhibere et ad illius Virginis primor- dia transferre, quae uno eodemquc decreto cum divinae Sapientiae fncarnatione fuerant praestituta".
(5) Sintetizando o pensamento tomista sobre o assunto, veja-se: Garrigou-Lagrange, LA SYNTHÊSE THOMISTE, Ivè-me P., chap. VI; veja-se também: Roschini, MARIOLOGIA, I. T., P. I, Sectio I; e Bover, ESTUDIOS MARIANOS, I (1942), 103-165.
(6) In. Luc. II, 87 (Migne - P. L. XV, 1585).
(7) Sermo de Aquaeductu.

(8) In. Virg. Nat., Sermo III



NOTA: Para ler mais sobre “Maria “Dispensadora de Todas as Graças”, acesse nossa postagem anterior no marcador Temas Marianos, à sua esquerda, sob o título "A Virgem Imaculada, 'Dispensadora de Todas as Graças'".






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FONTE: opúsculo Nossa Senhora das Graças - Estudos Doutrinários, Pe. Antônio Miranda, S.D.N., Editora Luzes/1952, Primeira Parte: Maria, Cheia de Graça, Cap. I, pp. 19=26 - Texto revisto e atualizado, alguns destaques acrescentados)

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