Ó MARIA CONCEBIDA SEM PECADO, ROGAI POR NÓS QUE RECORREMOS A VÓS!

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020


NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS NO PLANO DE DEUS



Toda criatura, antes de existir no tempo, existiu na eternidade, dentro dos eternos desígnios de Deus. Para Deus não houve passado e nem haverá futuro. Existe, existiu e existirá sempre o eterno presente, pelo conhecimento atual de tudo, conhecimento esse que é, n'Ele, Deus, uma atualização eterna das causas. A história do mundo e das criaturas, é escrita e lida eternamente por Deus num presente sem principio e sem termo.
E é assim que Maria Santíssima existiu, no seio e no pensamento de Deus, eternamente.(1) E pode-se até dizer, mais que de outra criatura, Deus ocupou-se d'Ela, pois nenhuma outra mais intimamente está com Ele relacionada.
São Bernardo chega a afirmar que Maria Santíssima é a 'obra da eterna idealização de Deus' - opus oeterni concilii - e a sua 'preocupação de todos os séculos' - negotium soeculorum.(2)
'É uma coisa inconcebível diz o Venerável Olier – como Deus, desde a eternidade, antes da formação de todas as criaturas, trazia presente a seu espírito esta divina Esposa. Para Ele não há futuro nem passado; tudo é presente aos seus olhos: na luz eterna: Ele vê distintamente todas as causas. Desde toda a eternidade havia, portanto, no Pai, um caráter, uma figura, que representava Jesus Cristo e sua Mãe, e, desde então, estava Maria tão presente aos olhos e ao espírito de Deus, como se já fora formada, como se estivera já efetivamente no mundo'.
E por que e como se ocupava Deus de Nossa Senhora desde a eternidade? A resposta a estas perguntas põe-nos em face do mistério da Mediação universal de Maria no plano salvífico.

POR QUE ENTRA MARIA NO PLANO DIVINO
Por que estava Maria no pensamento eterno de Deus? Por causa do seu grande, do seu impreterível papel na obra divina.
A principal circunstância de uma realização qualquer preocupa constantemente a seu idealizador. E foi o que aconteceu com Deus em face de nossa salvação; querendo salvar-nos, e querendo salvar-nos por nós o quanto possível tornou-se circunstância principalíssima desta realização a Mulher que o coadjuvaria neste divino mistério. E foi por isto que Maria Santíssima entrou nas preocupações de Deus juntamente com os mistérios eternos do divino Filho.
Longe de nós afirmar qualquer dependência em Deus.
Maria SS. é uma circunstância principalíssima na obra redentora, mas não era absolutamente necessária à execução dos divinos mistérios. Poderia Deus, se o quisesse, providenciar de outro modo ao resgate do gênero humano.
Anunciação de Maria

A verdade, porém, é que não o quis. Tal foi o seu desígnio eterno: que o Verbo se encarnasse; e que se incarnasse em Maria Virgem; que associasse a toda a obra divina de nossa salvação uma mulher. E isto Deus o quis desde toda a eternidade, e o quis irrevogavelmente. Já então Nossa Senhora se torna uma circunstância necessária por 'necessidade de fato, vista a preordenação do plano divino. Esta necessidade não nasce de precisão alguma de Deus, mas do fato de Ele assim querer eternamente.
Logo, Maria SS., pelo querer de Deus, recebeu um papel impreterível e grandioso na obra de Deus. E Deus não pôde deixar de tê-la sempre diante dos olhos e devotar-lhe um amor de predileção. A Ela, principalmente, diz Deus: In charitate perpetua dilexi te.(3)
No plano divino aparecem, por isto, unidos, numa só visão, eternamente, o Verbo Encarnado e Maria, sua Mãe.(4) Não podem ser desunidos no pensamento do Altíssimo e, como tal, jamais deverão ser separados no amor das criaturas.

COMO ENTRA MARIA NO PLANO DIVINO
E como entra a SS. Virgem nesta idealização eterna?
Totalmente, respondemos. Isto é, Maria não entra e não pode entrar nos segredos irrevogáveis de Deus como um auxílio secundário e esporádico, que, uma vez utilizado, vai perder sua razão de ser. Sua inclusão no plano salvífico é total porque divina e irrevogável.
Maria, por assim dizer, preocupa Deus eternamente, devido à excelência e à extensão de seu papel. Trata-se de formar uma digna Mãe de Deus no tempo e trata-se de outorgar-lhe um papel tão extenso e durável quanto toda a obrá 'ad-extra' de Deus.
O Infinito não faz as suas obras pela metade e nem imperfeitamente. Logo, Maria será o que há de mais excelente em dignidade ede mais duradouro em sua função. A sua atuação na grande obra de Deus será tão duradoura quanto esta própria obra.
Não se trata, pois, somente, da predestinação inaudita à maternidade divina, o que é uma visão parcial do desígnio eterno sobre Maria. Trata-se da predestinação da Virgem a tudo o que se realizar mediante a Encarnação do Verbo.
Tem-se salientado suficientemente a idealização eterna de uma Mãe de Deus, ornada de todos os favores, privilégios e graças. Mas tem-se esquecido que Nossa Senhora não é só isso. Deus idealizou sua Mãe completa, que é também nossa Mãe na ordem da graça.
Se idealizou-a em ordem à Encarnação, idealizou-a também em ordem à Redenção, em ordem à Eucaristia, em ordem à organização da Igreja, em ordem à Mediação universal. Porventura não tem Maria SS. o seu papel em tudo isto? Portanto, a tudo isto foi predestinada 'ab oeterno'.(5)
Maria, Sede da Sabedoria

CONSEQUÊNCIAS PARA A TEOLOGIA
A predestinação de Nossa Senhora assim compreendida mostra-nos que todas as graças que Deus lhe predestinou têm um alcance mais vasto do que simplesmente prepará-la à Maternidade divina. Destinam-se a prepará-la à Mediação universal das graças.
Toda a relação eterna de Deus para com Maria, se assim posso dizer, tende, portanto, mais sinteticamente, a formar a divina Medianeira entre Deus e os homens. A formação da Medianeira universal inclui a formação da Mãe divina.
Sob este aspecto, a teologia marial recebe um novo fulgor muito mais caro ao coração do homem, para quem em última análise Maria Santíssima é idealizada nos planos de Deus. Vê-se então a Deus como 'summum bonum, diffusivum sui', cogitando de dar-se a nós por meio de Maria ao mesmo tempo que cogita receber alguma coisa de nós por meio de Maria.
A preparação de Nossa Senhora, quer pela sua Conceição Imaculada, quer pelo crescimento contínuo de suas graças em várias plenitudes, projeta-se, portanto, na totalidade da obra salvífica de Maria, ou seja, na Mediação, e não só na sua Maternidade divina. E é neste sentido que podemos falar, com exatidão teológica, de Nossa Senhora das Graças no plano eterno de Deus.
A última realidade na execução é a primeira nos planos, sentenciam os filósofos. Sobretudo em Deus, é isto verdade de longo alcance. O que por último se executa no tempo foi o que por primeiro se idealizou na eternidade.
E, na ordem do desenvolvimento dos dogmas marianos, assim como o último que se propõe às almas é a Mediação de Maria, assim foi ele o primeiro intencionado nos planos divinos.

O FATO DA MEDIAÇÃO NO EVANGELHO
No reverso da Medalha Milagrosa, os Corações
(dolorosos) de Jesus e Maria estão unido;,
a cruz está entrelaçada - como que apoiada -
sobre o M de Maria

Por isto mesmo, nada que tenha mais plena realização no Evangelho e na história da Igreja do que a Mediação de Maria. Nossa Senhora aí aparece ligada a toda a estrutura vital do cristianismo. Ela está no princípio da vida cristã – a Encarnação – e prende-se tão intimamente com Jesus Cristo, Verbo Encarnado, que é d'Ele inseparável no tempo e na eternidade.
Impossível separar Cristo de sua divina Mãe em todos os mistérios, desde a própria Trindade, cujo Verbo, anteriormente ao tempo, já se determinara a ser o Filho de Maria.
Nasceu a Vida nova, sobrenatural, para os cristãos, graças ao sangue de Cristo Redentor. E Maria foi quem lhe deu este sangue, quem formou nas puríssimas entranhas o corpo sacrossanto, Vítima futura do Calvário, de cujo lado aberto nasceu a Vida. É Maria, continuando a ser um fato no plano salvífico.
Deste mesmo Coração trespassado de Cristo nasce a Igreja, Esposa de Jesus – diz Sto. Ambrósio.(6) E Maria SS. é, não só a primeira que à Igreja se incorpora, mas também a primeira que a assiste, conforta e ensina, continuando, com os Apóstolos, a obra de Jesus. Muito mais que simples incorporada e continuadora, com os Apóstolos, da obra de Cristo, Maria – primeira resgatada e incorporada – começa logo a cooperar com Jesus na própria Redenção objetiva. É Corredentora, não no sentido vulgar em que nós também podemos ser corredentores, na aplicação dos méritos, mas lá, na aquisição deles.
Nos primórdios da Igreja nascente, Nossa Senhora já era a Senhora dos primeiros cristãos, a Mãe de todos eles, não por título de afeição, mas por ordenação divina. Mediante Maria, comunicava Deus as primeiras graças à sua Igreja.
Vão os Apóstolos para o Cenáculo. Está a sociedade divino-humana que Jesus fundou prestes a ser promulgada solenemente com a descida do Paráclito. E Maria Santíssima lá está com a Igreja, orando, e certamente instruindo. Inegável à luz da mais sã teologia que a prece da Virgem forçou poderosamente o coração do Pai e do Filho para a missão visível do Espírito Santo, como anteriormente abreviara as esperanças do Messias, apressando a Encarnação do Verbo. E é por isto que o Autor do Atos tem o particular cuidado de mencionar-lhe o nome entre os Apóstolos reunidos no Cenáculo: Omne.s erant perseverontes unanimiier in oratione um ... Maria Matre Jesu ... É o fato de Maria no plano sobrenatural prolongando-se em todos os mistérios. Encarnação, Redenção, fundação da Igreja, vinda do Espirito Santo, fração do pão ou Eucaristia – e consequentemente a vida cristã através dos séculos, a qual dimana destes mistérios – tudo está preso, inquebrantavelmente à oração de Maria, à Mediação universal de Maria.

CONCLUSÃO
Grande e sublime verdade! Deus quis, desde a eternidade, que uma simples mulher regesse, a bem dizer, toda a vida sobrenatural dos homens. Maria SS. é a impreterível Medianeira entre Cristo e nós.
A sim querido este "fato" desde o principio dos tempos, até o fim dos mesmos tempos Deus o levará à execução.
Começará por preparar Maria. A infinidade de seus dons, Deus os derramará em Maria. Totius boni plenitudinem posuit in Maria – diz São Bernardo.(7) E Ela há-de ser "cheia de graça" – gratia plena.
E tudo terminará por constituí-la Deus Dispenseira destes mesmos bens. E a não ser por Ela e d'Ela, ninguém receberá a graça de Deus. Omnia nos habere voluit per manas Mariae, completa S. Bernardo.(8)
Cheia de graça para si, Deus a quis mais cheia ainda para nós. Plena sibi, superplena nobis.
Sim, tudo o que descer do céu será embalsamado pelo fragor de suas preces e trará o hálito celeste de seus beijos de Mãe!"




_________________
(1) "Ce n'est pas seulement au moment où il allait réalizer ses promessas miséricordieuses et donner à la terra le Redempteur qu'il lui avait annoncé, que Dieu se préocupa de choisir une mere pour son Fils. De toute éternité, la creature bénie qu'il devait associer à sou oeuvre du salut avait été présente à sa pensée. L'Égllse nous l'affirme de la façon plus formelle lorsqu'elle appllque à larie, dans sa liturgia, les pa- roles qui ont été dites de la Sagesse éternelle". (Ganiguet - La Viège Marie, 7ème édit., p. 9)
(2) Sermo II De Pentecoste.
(3) Jer. 31, 31
(4) Ex Bulia (logmatica Pii Papae IX - "... Ab inltio et ante soecula unigenito Filio suo Matrem, ex qua caro factus in beata temporum plenitudine na.sceretur, elegit atque ordinavit, tantoque prae creaturis universis est prosecutus ama- re... " "Ipsissima Verba, quibus divinae Scripturae de increa- ta Saplentia loquuntur, ejusque sempiternas origines reprae- sentant, consuevit Ecclesia., tum in ecclesiasticis officiis, tum in sacrosancta liturgia aãhibere et ad illius Virginis primor- dia transferre, quae uno eodemquc decreto cum divinae Sapientiae fncarnatione fuerant praestituta".
(5) Sintetizando o pensamento tomista sobre o assunto, veja-se: Garrigou-Lagrange, LA SYNTHÊSE THOMISTE, Ivè-me P., chap. VI; veja-se também: Roschini, MARIOLOGIA, I. T., P. I, Sectio I; e Bover, ESTUDIOS MARIANOS, I (1942), 103-165.
(6) In. Luc. II, 87 (Migne - P. L. XV, 1585).
(7) Sermo de Aquaeductu.

(8) In. Virg. Nat., Sermo III



NOTA: Para ler mais sobre “Maria “Dispensadora de Todas as Graças”, acesse nossa postagem anterior no marcador Temas Marianos, à sua esquerda, sob o título "A Virgem Imaculada, 'Dispensadora de Todas as Graças'".






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FONTE: opúsculo Nossa Senhora das Graças - Estudos Doutrinários, Pe. Antônio Miranda, S.D.N., Editora Luzes/1952, Primeira Parte: Maria, Cheia de Graça, Cap. I, pp. 19=26 - Texto revisto e atualizado, alguns destaques acrescentados)

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020


A MEDALHA MILAGROSA E A CONVERSÃO DE AFONSO RATISBONNE


Madonna del Miracollo


"Nessa maravilhosa conversão manifesta-se o dedo de Deus; aí se admira o poder de Maria Santíssima, pois não havia nada, absolutamente nada que dispusesse Afonso Ratisbonne para receber tão assinalado favor.
Nasceu Afonso em Strasburgo, no meio de uma rica família israelita. Eram ao todo dez irmãos. Teodoro, doze anos mais velho que Afonso, chega à fé cristã após longas e penosas pesquisas, na calma da reflexão e na plena madureza de espírito.
Teodoro, recebeu o batismo aos 25 anos, após haver concluído seu curso de Direito. Abraçou o estado eclesiástico e foi sagrado sacerdote cinco anos depois do seu batismo.
Seu irmão Afonso, desde a primeira mocidade jactava-se de não ter nenhuma religião. “Eu era judeu de nome, diz ele; eis tudo, porque eu não acreditava nem sequer em Deus. Nunca abri um livro de religião e, na casa do meu tio, bem como entre meus irmãos e irmãs, não se praticava a menor prescrição do judaísmo”.
Um ano e quatro meses antes da sua conversão, enfermara gravemente um dos seus sobrinhos, filho do seu irmão mais velho. O Padre Teodoro, que então exercia os seus ministérios sacerdotais em Paris, desejava pelo menos abrir as portas do céu a seu sobrinho, conferindo-lhe o santo batismo.
Teria talvez alcançado o assentimento do pai, se não fosse a intervenção do seu irmão Afonso que, cheio de indignação e de furor, enxotou violentamente para longe do pequenino moribundo o ministro de Deus. Este, que já havia sofrido tanto da parte da sua família e de toda a colônia israelita, retirou-se com calma, disposto a sofrer ainda mais pelo nome de Jesus Cristo e pela salvação dos seus.
No Santuário de Nossa Senhora das Vitórias, onde trabalhava, fazia o piedoso sacerdote ferventes preces pela conversão do seu irmão Afonso que o não podia tolerar. Como explicar tamanho ódio contra seu bondoso irmão Teodoro, se Afonso era judeu religiosamente falando só de nome? É que ele se filiara a maçonaria e então era implacável inimigo dos cristãos.


Havia Afonso concluído seu curso de Direito e estava para completar 27 anos, quando os desejos da sua família, corroborados por simpatia recíproca, o induziram a casar-se com a sua sobrinha, filha do seu irmão mais velho. “Pensei, então, narra Afonso, que a minha felicidade fosse completa. Via minha família no auge da alegria, pois devo dizê-lo, há poucas famílias cujos membros se unem tanto como a minha… Só um dos seus membros me parecia odioso: era meu irmão Teodoro. Entretanto ele também nos amava, mas seu hábito me causava repulsa, seu pensamento me turbava, sua palavra grave e séria excitava a minha cólera”.
E, continua Afonso, “por causa da conversão de Teodoro eu nutria acerbíssimo ódio contra os padres, as igrejas, os conventos, e sobretudo contra os jesuítas, cujo nome só bastava para provocar o meu furor”.
A noiva de Afonso contava 16 anos apenas, pelo que julgaram seus pais conveniente diferir por algum tempo o casamento.
Neste meio tempo Afonso empreenderia uma viagem ao estrangeiro com o duplo fim de distrair-se e de revigorar a sua saúde.
Afonso deixou Strasburgo a 17 de novembro de 1841, decidido a visitar Nápoles, a passar o inverno em Malta e a voltar pelo Oriente. Outros, porém, eram os desígnios da Providência. Demorou alguns dias em Marselha e partiu para Nápoles.
Durante a viagem fundeou o navio em Civitavecchia: era o dia 8 de dezembro e a artilharia disparava algumas salvas. Maravilhado, perguntou Afonso qual era o motivo daqueles rumores de guerra nas terras pacíficas do Papa. Responderam-lhe que era a festa da Imaculada Conceição. Sacudiu os ombros com desdém e não quis desembarcar. Não tinha nenhum desejo de visitar Roma, embora dois amigos seus o estimulassem vivamente a dar esse passo. Deus, porém, o guiava para o Cidade Eterna. Ao deixar Nápoles, em vez de comprar passagem para Palermo. por engano achou-se numa diligência que se dirigia para Roma e lá chegou a 6 de Janeiro.
Era o ano de 1842. Afonso Ratisbonne achava-se em Roma, a cidade eterna, da qual cada pedra é uma lembrança sagrada e tem uma voz para celebrar as grandezas da fé cristã. Ali Ratisbonne encontrou seu companheiro de infância Gustavo Bussíère, irmão do barão Teodoro de Busssière.
Teodoro de Bussière era íntimo amigo do Padre Teodoro Ratisbonne. O Barão abandonara o protestantismo para fazer-se católico e por esta razão inspirava a Afonso Ratisbonne uma profunda antipatia. Gustavo Bussière mantinha-se protestante e, em companhia de Afonso Ratisbonne, metia frequentemente a ridículo a Igreja Católica.
Afonso Rastibonne já padre

A 15 de Janeiro, nove dias apenas depois de sua chegada, resolveu Afonso deixar Roma e se viu na dura contingência de ir apresentar suas despedidas ao indesejável barão Teodoro de Bussière. O distinto e piedoso barão suportou pacientemente, durante uma hora, uma saraivada de sarcasmos proferidos pelo jovem Afonso contra o catolicismo, procurando evidentemente atingir os dois Teodoros convertidos: o seu irmão Ratisbonne convertido do judaísmo; e o irmão de Gustavo Bussière, convertido do protestantismo.
Então, – refere o barão – apresentou-se à minha mente uma ideia maravilhosa, uma ideia celeste, que os sábios do mundo teriam julgado rematada loucura: “Já que sois um espírito tão forte e seguro de vós mesmo, lhe disse, não recusareis trazer o que estou para dar-vos”.
  • De que se trata? perguntou secamente Afonso. – “Respondi-lhe mansamente – disse Bussière, trata-se simplesmente desta medalha”. Era a medalha milagrosa de Nossa Senhora das Graças. Recusou-a Afonso com um misto de indignação e de espanto.
  • Mas – acrescentou o barão Bussière friamente – segundo o vosso modo de ver, isto vos deve ser absolutamente indiferente, ao passo que para mim trará um grandíssimo prazer”. – “Oh! – exclamou Afonso rindo a bom rir, a bandeiras despregadas – “então a trarei por mera complacência para mostrar-vos que é sem razão que acusam os judeus de obstinação e de invencível teimosia. Além disso me fornecereis um belíssimo capítulo para as minhas notas e impressões de viagem”.
E, prossegue o barão, “Ratisbonne continuava com motejos que me ralavam o coração… Entretanto, passei-lhe ao pescoço uma fita à qual minhas netinhas tinham pregado uma medalha. Mas restava-me ainda uma coisa mais difícil de obter: queria que ele recitasse a piedosa invocação de São Bernardo: “Lembrai-vos, ó piíssima Virgem Maria…” Revoltou-se ao ouvir este segundo pedido. “Mas uma força interior impelia-me, prossegue B. de Bussuère, a lutar contra as suas reiteradas recusas com uma espécie de obstinação. Apresentei-lhe a oração suplicando-lhe que a trouxesse consigo e que tivesse a bondade de copiá-la porque eu não dispunha de outro exemplar”. Então, com um movimento de impaciência e ironia, para se ver livre das minhas importunações, disse ele: “Bem! eu escreverei; dar-vos-ei a minha cópia e conservarei a vossa”. E retirou-se visivelmente contrariado.
Afonso cumpriu a palavra; copiou a oração, leu-a e releu-a tantas vezes que já a sabia de cor. As palavras de “Memorare” não lhe saíam da memória.
No dia 20 de Janeiro, festa de São Sebastião, Afonso ainda se achava em Roma, onde o retinha uma força misteriosa. Ao meio dia conversou num café com dois amigos. “Se neste momento – diz ele – um terceiro interlocutor se tivesse aproximado de mim e me tivesse dito: “Afonso, dentro de um quarto de hora adorarás Jesus Cristo, teu Deus e teu Salvador… e renunciarás ao mundo, a suas pompas, a seus prazeres, a tua fortuna, a tuas esperanças, a teu futuro, e se for necessário renunciarás ainda a tua noiva, à afeição da tua família… Digo que se algum profeta me tivesse feito semelhante predição, só a um homem eu julgaria mais insensato que ele, e seria aquele que tivesse dado crédito à possibilidade de tal loucura”.
A Medalha Milagrosa

Era 20 de Janeiro de 1842. Ratisbonne acha-se ainda em Roma. Saindo de um Café onde acabara de conversar com dois amigos, encontra uma carruagem: é do Barão de Bussière que o convida para dar um passeio. Afonso, sem muito entusiasmo, mais para não fazer uma descortesia àquele do qual pouco antes tinha sido hóspede, aceita o convite. Acharam-se logo diante da igreja de Santo André delle Fratte. O piedoso conde de Laferronays devia receber as honras fúnebres e o Barão de Bussière fora encarregado de reservar uma tribuna para a família do defunto.
Será coisa de dois minutos, diz ele a Afonso que, durante este tempo resolve visitar a igreja. Esperava-o nesta igreja a misericórdia de Maria Santíssima. Soara a hora da graça que desde a conversa no café, já trabalhava suavemente em sua alma. A Mãe de Deus se deixara comover pelas orações do barão de Bussière , do conde de Laferronays que morrera repentinamente depois de ter dito à sua esposa: “Repeti hoje mais de cem vezes o Lembrai-vos”, e sobretudo pelas orações e lágrimas ardentes que em seu Santuário derramava seu diletíssimo servo o Padre Teodoro, irmão de Afonso Ratisbonne.
Tenta Afonso descrever o que então se passou em sua alma: “Esta igreja é pobre e deserta; creio que nela me achei mais ou menos só… Nenhum objeto de arte atraiu a minha atenção… Subitamente nada mais vejo… ou antes, ó meu Deus, vejo uma só coisa! Como seria possível falar do que vi? Oh! não, a palavra humana não deve tentar exprimir o que se não pode exprimir; toda descrição, por sublime que seja, não seria mais que uma profanação da inefável realidade…”
Tornando à igreja, Barão de Bussière não encontra Afonso onde o havia deixado, mas ajoelhado diante da capela de São Miguel Arcanjo e de São Rafael, submergido em profundo recolhimento.
A esta vista, pressentindo um milagre, depõe o barão, apoderou-se de mim um frêmito religioso. Dirijo-me a ele, agito-o várias vezes sem que ele dê conta da minha presença. Afinal, voltando para mim seu rosto banhado de lágrimas, junta as mãos e me diz: “Oh! como este senhor rezou por mim!”
Compreendi logo que se tratava do falecido Conde de Laferronays. Amparado, quase levado por mim, sobe à carruagem. Onde quereis ir? pergunto-lhe eu.
– “Levai-me para onde quiserdes. Depois do que vi, obedeço”.
Declara-me em seguida que só falará com o consentimento de um padre, porque o que eu vi – acrescenta ele – só o posso dizer de joelhos”.
Conduzido à igreja do Jesú, dos padres jesuítas, ao lado do padre Villefort que o convida a explicar-se, tira Afonso a medalha, abraça-a, mostra-a e exclama: “Eu a vi! Eu a vi!… Havia uns instantes que eu estava na igreja, quando repentinamente me senti dominado por uma turbação inexprimível. Ergui os olhos; todo o edifício desparecera à minha vista; só uma capela tinha, por assim dizer, concentrado toda a luz; e, no meio desta irradiação, apareceu, em pé sobre o altar, grande, brilhante, cheia de majestade de doçura a Virgem Maria, tal qual está em minha medalha; uma força irresistível atraiu-me para ela. A Virgem com a mão me fez sinal para que me ajoelhasse. Pareceu dizer-me: “Está bem! Não me falou nada, mas eu compreendi tudo”.

Mais tarde dirigiu-se Afonso à Basílica de Santa Maria Maior a fim de agradecer a sua celeste benfeitora o grande benefício recebido.
Ao entrar na capela de Nossa Senhora, exclamou: “Oh! como estou bem aqui! Gostaria de ficar aqui para sempre: parece-me que já não estou na terra!”
Ao fazer a visita ao Santíssimo Sacramento, por pouco não desfaleceu. Apavorado, exclamou: “que coisa horrível estar na presença do Deus vivo sem ser batizado!”
Afirma o Padre Roothan, geral da Companhia de Jesus, que “depois da sua conversão o senso da fé nele se manifestava de modo tão intenso que lhe fazia sentir, penetrar e reter tudo o que lhe era proposto, tanto que em pouco tempo o julgaram suficientemente instruído para receber o santo Batismo”.
Ratisbonne recebeu sem dúvida uma assistência toda especial de Deus e da Santíssima Virgem.
A 31 de Janeiro, 11 dias após a aparição, Afonso Ratisbonne abjura solenemente a maçonaria e recebe o batismo na igreja do Gesú das mãos do cardeal Patrizzi. O vasto e suntuoso templo estava repleto. Ali se encontrava o escol da sociedade romana e estrangeira. Acompanhado pelo Padre Villefort e por seu padrinho, o barão de Bussière, Afonso foi levado à porta da igreja. Vestido de uma longa túnica de damasco branco, trazia o Terço e a medalha de Nossa Senhora nas mãos.
Que pedes à Igreja de Deus? pergunta-lhe o oficiante.
A fé!
Ah! diz uma testemunha ocular dessa cena majestosa, já tinha a fé católica aquele a quem a estrela da manhã iluminara com os seus raios.
Afonso beija a terra e fica prostrado até ao fim dos exorcismos.
Levanta-se e, guiado pelo pontífice, encaminha-se para o altar entre as bênçãos de uma imensa multidão que respeitosamente se abre à sua passagem.
Perguntam-lhe qual é o seu nome.
Maria! responde num arrebatamento de amor e de gratidão.
Que desejas?
O batismo.
Crês em Jesus Cristo?
Creio!
Queres ser batizado?
Quero!
Com um sorriso de celeste beatitude levantou sua cabeça ainda umedecida da água batismal. Acabava de transpor um abismo: era cristão.
Afonso, cheio de Deus, radicalmente transformado pela graça, deixa o mundo e entra na Companhia de Jesus. Nela viveu dez anos vida exemplar e só a deixou, desfeito em lágrimas, para fazer a vontade de Deus que o queria ao lado do seu irmão, o Padre Teodoro, para com ele trabalhar numa obra tão grata ao mesmo Deus e de tanta relevância, qual é a da conversão dos judeus.
O piedoso Padre Maria Afonso Ratisbonne nunca se esqueceu de sua Mãe amantíssima que o arrancou das trevas da incredulidade para os esplendores da verdadeira fé.
Inclinava-se profundamente sempre que ouvia no canto das ladainhas a invocação: “Refúgio dos pecadores, rogai por nós!”
Os que o ouviam falar da sua Mãe Celeste adivinhavam o que se passava no seu coração; seu olhar fulgurante parecia que ainda contemplava a mais bela e a mais pura das virgens.
A medalha milagrosa, que exercera papel preponderante em sua conversão, era o seu mais caro tesouro. Julgou um dia que a havia perdido; sua aflição foi extrema; parecia-lhe que fora abandonado pela Virgem misericordiosíssima. Suas lágrimas não cessaram de correr até que a encontrou.
Maria Santíssima foi a sua consolação em todas as penas e seu grande motivo de esperança em todas as provações. Dizia que Maria Santíssima não é outra coisa que uma mão de Deus, não a mão que castiga, mas a mão das misericórdias.
Dizem os historiadores que quando o Padre Ratisbonne pregava sobre Nossa Senhora, todos os ouvintes se comoviam, muitos pecadores se convertiam. Leiam por gentileza o próximo post deste blog e verão a conversão mais importante que o Padre Maria Afonso obteve por intercessão de Maria Santíssima.
Caríssimos leitores, possa esse episódio tão comovente, que acabais de ler, reavivar em vossos corações a chama da devoção a Santíssima Virgem Maria.
Se quisermos assegurar o único bem desejável que é a eterna salvação de nossa alma, vivamos, como bons filhos, no Coração maternal de Maria Santíssima.
Os que a ela recorrem não deixam de ser ouvidos; os que choram em seu regaço materno não deixam de ser consolados e os que nela depositam inteira confiança e evitam tudo o que possa magoar-lhe o coração, nada têm que temer nem na vida nem na morte.
A devoção sincera a Maria Santíssima é penhor seguro de salvação. Deus quis que por ela tivéssemos Jesus. E Jesus é a nossa salvação. Por isso o pedido que nos faz a Nossa Mãezinha do Céu é este: “Não ofendam mais o meu Filho!”
As coisas aqui narradas foram quase integralmente extraídas do livro: “O caminho que leva para Deus” do Pe. Arlindo Vieira, S. J.



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