SANTA CATARINA LABOURÉ E A VISÃO DO CORAÇÃO DE SÃO VICENTE DE PAULO
Em
1856, por obediência ao seu cofessor, Padre Aladel, a Irmã Catarina
escreveu a narrativa de suas primeiras visões, de Abril a Julho de
1830. Esta narrativa nos servirá de guia. Apenas explicaremos alguns
pontos, e completaremos outros.
“Cheguei à Casa-Mãe a 21 de abril de 1830, na quarta-feira antes da Transladação das Relíquias de S. Vicente de Paulo. Feliz e contente, por ter chegado antes deste grande dia, parecia-me não estar mais na terra1. No dia festa, eu pedi a s. Vicente todas as graças, que me eram necessárias, e também pelas suas duas Famílias (os Padres da Missão e as Irmãs de Caridade) e pela França. Parecia-me que todos estavam passando por grande necessidade. Enfim, eu pedia a S. Vicente que me ensinasse o que eu devia pedir, com fé viva.
“E todas as vezes que eu voltava de S. Lázaro, durante a novena, à qual as Irmãs iam diariamente em peregrinação, eu sentia grande aflição: parecia-me que ia encontrar em nossa Comunidade a S. Vicente, ou ao menos o seu coração, que me aparecia todas as vezes que eu voltava de S. Lázaro.”
Altar de São Vicente de Paulo na capela da Rue du Bac, Paris. À frente da imagem, o relicário com o coração do Santo |
Onde
se mostrava o coração de S. Vicente?
“Eu sentia consolação de vê-lo, escreve a Vidente, em cima do pequeno ostensório em que as suas relíquias estavam expostas, na capela da Casa-Mãe.”2
Mas
sob que forma se manifestava o coração de S. Vicente?
“Ele me apareceu de três formas diferentes, em três dias seguidos: branco cor de carne, o que anunciava a paz, a calma, a inocência e a união; depois eu o vi vermelho cor de fogo, o que deve acender a caridade nos corações: parece-me que a Comunidade deve se renovar e se estender até os confins do mundo; finalmente eu o vi vermelho-preto, o que me causou extrema tristeza. Custava-me muito suportar a angústia desta tristeza, e, sem saber como e nem porquê, eu sentia essa tal tristeza, sentia que a causa era a mudança do governo.”
A
Irmã Catarina conclui a narrativa desta primeira visão,
declarando-se inteiramente submissa: “Entretanto,
resolvi manifestar tudo isto ao meu confessor, que me acalmou quanto
é possível, mandando que eu fastasse todos esses pensamentos.”3
É
relativamente extraordinário que uma humilde camponesa, inteiramente
ignorante de assuntos políticos, tivesse preocupações a respeito
da mudança do governo. Mesmo que ela conhecesse as questões
políticas do momento, como poderia prever, em plena glória do
reino, que a realeza estava em perigo?
Relicário com o coração de S. Vicente, em visita à Paróquia Nossa Senhora da Salette de Paris (entre 25.02 e 05.03.17) |
Quem,
em Abril, poderia sequer pensar nos acontecimentos de Julho, no
sangue derramdo na queda de Carlos X?
A
Vidente acrescenta que uma voz interior lhe falava: “O
coração de S. Vicente está grandemente aflito com os males que vão
cair sobre a França.”
No derradeiro dia, enquanto o coração do Santo se lhe mostrava,
numa bela cor vermelha, a voz interior lhe dizia: “O
coração de S. Vicente está um pouco mais consolado, porque obteve
de Deus, por intercessão de Maria, que as suas Famílias não
perecessem no meio desses males, e que elas servissem para revigorar
a fé.”
O
confessor era o Padre Aladel, ainda moço e inexperiente, e a Irmã
Catarina dirigia-se a ele pelo primeira vez. A noviça era
recém-chegada no seminário e ainda não dera mostra da natureza do
seu temperamento e imaginação. Que crédito mereciam aquelas
palavras, anunciando tristezas, quando naquele mês tudo respirava
alegrias? O diretor de consciência agiu, pois, prudentemente,
mandando que a penitente afastasse esses pensamentos.
Relicário com o coração de São Vicente de Paulo |
O
futuro ia provar, de fato, que as duas Famílias de S. Vicente de
Paulo se renovariam, no século XIX, no espírito do fundador, e se
estenderiam com a graça de Deus até os confins do mundo. Mas o
Padre Aladel desconhecia o futuro, e mesmo que conhecesse, devia
guardar extrema reserva sobre esta primeira revelação que a jovem
Irmã lhe segredava, como sobre as demais que vão seguir quase
imediatamente.
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1 Esta
solenidade, da qual fala a jovem noviça, foia a maior glorificação
que a França prestou a S. Vicente de Paulo. As suas preciosas
relíquias permaneceram escondidas durante os anos da Revolução. –
De 1815 até 1830 ficaram na Casa-Mãe das Irmãs de Caridade. O
Arcebispo de Paris, Monsenhor de Quelen, quis glorificar o “Santo
francês por excelência”, que fez, por toda parte, conhecer, amar
e bendizer o nome da França, e ordenou que suas relíquias fossem
transladadas, com o maior esplendor e grande concorrência de
Bispos, de padre e fieis, desde a igreja metropolitana de Notre-Dame
até os Padres da Missão, na Rua de Sèvres, 95. – A população
de Paris se comprimia nas ruas, e até nos telhados das casas,
saudando os despojos do herói da caridade e dano os mais
inequívocos sinais de alegria e de respeito.
Mons.
de Quelen proferiu nessa tarde memorável estas palavras eloquentes:
“Como me sinto feliz! Que doces consolações me proporciona esta
festa! Agora, Deus pode enviar-me as tribulações que lhe aprouver;
sinto-me com forças para suportá-las, tenho o coração
retemperado!”
2 Em
frente da porta atual da sacristia, sob o quadro de Sant'Ana, havia
uma pequena mesa sobre a qual se a qual se colocava o relicário de
S. Vicente durante a novena de sua Festa. Foi aí que se produziu a
Aparição durante a meditação das cinco horas da tarde.
3 Carta
ao Padre Aladel, em 1856. Arquivo da Casa-Mãe da Rua du Bac.
FONTE: CASTRO, Pe. Jerônimo P. de. “Santa Catarina Labouré e a Medalha Milagrosa”, Editora Vozes, Cap. III, pp. 65 a 69 (texto revisto e atualizado, e grifos acrescidos)
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