SANTA CATARINA LABOURÉ: UM SONHO PROFÉTICO
Fotografia autêntica de Santa Catarina Labouré, tirada em vida, em 1876, pouco antes de seu falecimento |
“A
primeira, embora não a única ambição de Catarina Labouré, em
Fain, era viver em 'união com Deus'. Mas a sua alma generosa
alimentava uma aspiração superior e profunda, desde a primeira
comunhão: a de consagra-se a Deus na vida religiosa. E suspira pelo
dia em que pudesse trocar os trabalhos do campo, pelo serviço
exclusivo de Deus, a que um secreto apelo a levava.
Que
comunidade seria a sua? Ela ignorava. Um fato singular deu-lhe a
solução do problema. Ela mesma o contou, no fim da vida, como um
sonho, que teria tido aos dezoito anos de idade. Este sonho tem algo
de visão intelectual, pois o quadro era composto de elementos
vários, inesperados e desconhecidos.
Ela
pensava estar ajoelhada na capela da Virgem, como era de seu costume,
quando um padre idoso, paramentado, apareceu e começou a celebrar a
Missa. Cada vez que se voltava para dizer o Dóminus vobíscum1,
o seu rosto expandia grande bondade, e o olhar fixava-se sobre ela.
Como
tudo se passa depressa nos sonhos, a Missa acabou logo, e o padre,
voltando para a sacristia, lhe fez sinal que o seguisse. Mas,
amedrontada, como nos pesadelos, apesar de tudo ser tão doce e suave
nesse sonho, Zoé2
apressou-se a fugir da igreja.
São Vicente de Paulo, co-fundador das Filhas de Caridade |
Perturbada,
antes de voltar para casa, foi tratar de uma pobre mulher doente. Eis
que o velho padre a seguiu até o quarto da enferma, conservando-se
atrás, e lhe disse:
'É uma boa obra tratar dos doentes. Hoje tu me fojes… mas um dia tu me procurarás… Deus tem desígnios sobre ti. Não te esqueças!'.
E
Zoé despertou numa alegria espiritual radiante.
Este
sonho foi o primeiro dos sinais sensíveis do sobrenatural, que
conhecermos em Zoé Labouré, e realizou-se completamente em breve
tempo. Na ocasião ninguém soube de coisa alguma, porque só
cinquenta anos mais tarde, em 1875 ou 76, já velha religiosa, ela
mesma contou esse fato maravilhoso e o epílogo, que teve, à sua
irmã Maria Luísa, então doente na Casa-Mãe. Fez esta narrativa na
presença da Irmã Cosnard, sub-assistente, e esta comunicou ao
Processo (de canonização) todas as minúcias deste estranho
fenômeno. A memória da Irmã Catarina, conservara bem nítida a
impressão de seu sonho e de sua realização3.
Naquela
manhã, naturalmente, Zoé devia ter despertado perplexa. Quem seria
aquele padre de semblante tão amável? Que significavam as suas
palavras? Quais seriam os desígnios de Deus sobre ela? Não sabia
responder a nenhuma destas perguntas.
É
pouco provável que ela tenha segredado estas dúvidas a seu
confessor, o vigário de Moutiers. A sua excessiva timidez, o pudor
sobre seus segredos espirituais, a forçaram, por certo, a calar-se.
E como era dotada de espírito positivo, procurou vencer as
impressões, convencendo-se a princípio de que 'tudo não fora mais
do que um sonho'.
“Um
belo dia, bem informada pela cunhada, Zoé foi visitar um hospício
de Caridade, dirigido pelas Filhas de S. Vicente de Paulo, na margem
direita do rio que banha Châtillon, na Rua Haute-Juiverie. Diante da
porta principal notou uma estátua de S. Vicente de Paulo, com dois
meninos sob o manto, indicando que aquela casa era um desses asilos
em que a miséria e a fraqueza vão encontrar socorro.
S. Vicente de Paulo, trazendo sob o manto (batina) uma criança pobre |
Recebida
pela porteira e introduzida no parlatório, pede que chame a
superiora. Apenas assentada, levantando os olhos, percebe um quadro
pendurado na parede. Zoé, admirada, descobre que o Padre, ali
representado, é o mesmo que vira em sonho outrora, em Fain. 'É ele
mesmo!' convenceu-se ela; e lembra-se da fronte, dos olhos, do grande
nariz e dos lábios que lhe falaram tão bondosamente. Recorda-se dos
seus olhares durante a Missa e do insistente sorriso, quando lhe
dizia: 'Hoje tu me foges, mas um dia tu hás de me procurar.
Deus tem desígnios sobre ti. Não te esqueças.'
Zoé
ficou presa diante desse quadro, confusa, grandemente comovida.
Parecia-lhe estar envolvida numa atmosfera sobrenatural nesse
parlatório. Mais uma vez, ei-la fora da terra.
Entra
uma Irmã. Não era a superiora, mas uma auxiliar, a jovem Irmã
Francisca Vitória Sejóle, que em breve vai demonstrar uma
perspicácia espantosa sobre a vocação dessa humilde camponesa.
Depois das primeiras saudações, Zoé não se conteve mais e
perguntou:
–
Minha Irmã, quem é esse padre pintado neste quadro?
–
Não sabeis minha filha? É o nosso Pai S. Vicente de Paulo.
O
coração da Labouré teve um arrebatamento: sentiu que a sua vocação
estava decidida. Sentiu a delícia da paz iluminando-lhe a alma e
dissipando todas as dúvidas. Mas a Irmã Sejóle nada percebeu do
que se passava no íntimo de sua visitante. Com o semblante sério,
esta contou à Irmã a sua história e o seu desejo.
Na
próxima confissão, na igreja paroquial de Châtillon, Zoé declarou
ao vigário, Padre Prost, o seu sonho singular e a confirmação
comovente, que teve olhando para o quadro do parlatório do hospício.
'Sim, minha filha, respondeu o Padre, eu creio que esse padre, que vos apareceu em sonho, é S. Vicente de Paulo, e que ele vos chama para ser Irmã de Caridade.'”
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FONTE:
CASTRO, Pe. Jerônimo P. de. “Santa Catarina Labouré e a
Medalha Milagrosa”, Editora Vozes, 1951, Cap. II, pp. 42 a 44 e de 53
a 55 (texto revisto e atualizado)
2 “Zoé”
= era um carinhoso apelido de família dado à Catarina Labouré.
3 L.
Misermont, L'âme
de la B. Catherine Labouré.
No hospício de Moutiers-Saint-Jean há um belo quadro de S. Vicente
de Paulo. Mas, durante os Ofícios, corriam a cortina que ocultava o
altar, de modo que esse quadro ficava coberto. Zoé nunca tinha
olhado para ele. – Data do tempo de S. Vicente a fundação desse
hospício do Santo
Salvador.
Foi construído pelos ricos abades de Chandenier, dos quais Luis se
fez Padre da Missão. Diz uma tradição que S. Vicente foi a
Moutiers para escolher o local do hospício. (St. Vincent de Paul,
t. I, p. 345).
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